sexta-feira, 23 de março de 2012

Amanhã , dia 24 de Março de 2012 fazem cinco anos  de minha ordenação pastoral. Mesmo considerando que o inicio da minha caminhada pastoral se deu  no ano de 1993 quando assumi  oficialmente o ministério de Educação cristã da Igreja Batista do Pinheiro, a data da minha ordenação tornou-se especialmente  importante para mim por duas razões: 
Primeiro porque celebro um passo dado junto com outras mulheres batistas no Brasil  que decidiram enfrentar a eclesiologia patriarcal requerendo o direito a ordenação  de mulheres  não simplesmente como forma de  inserir mulheres  no espaço e na forma  de poder masculino , mas como caminho e forma de per-verter (  dá outra versão) ou subverter (  outra versão que vem de baixo para cima - revolver  ) o modelo ministerial batista estabelecido. É verdade é que esse é apenas um passo e que não é o único caminho, mas precisamos seguir sonhando uma eclesiologia de mulheres que possa ser uma alternativa eclesiológica para homens e mulheres que sonham numa Igreja de Iguais.
A outra razão porque celebro este dia, é porque o dia 24 de março é o dia que a América Latina faz memória do Dom Oscar Romero e procuro nesta data , todos os anos  revisitar  o sermão proferido por Wellington da minha ordenação. Uma mensagem inesquecível para mim, desafio constante em minha vida. O sermão foi inspirado na vida de Oscar Romero.  Compartilho o sermão como forma de renovar meu compromisso de seguir na  vida e no  ministério fiel a compromisso de vida e justiça que inspirou  a luta de Oscar Romero.
 
DESAFIOS MINISTERIAIS A PARTIR DA BIOGRAFIA DE ÓSCAR ROMERO

Em 24 de março de 1980, foi assassinado com um disparo de arma de fogo, enquanto celebrava uma missa no Hospital da Divina Providência, o Arcebispo de El Salvador, Monsenhor Óscar Romero. Um mês antes de ser assassinado, Monsenhor Romero declarou: “La voz de la justicia nadie la puede matar ya”. Com relação às ameaças do esquadrão da morte pelas posições que vinha tomando nos últimos três anos que antecedeu seu assassinato ele declarou: “Si me matam resucitaré em el pueblo salvadoreño. Como pastor estoy obligado a dar la vida por quienes amo, que son todos los salvadoreños. Mi muerte, si es aceptada por Dios, sea por la liberación de mi pueblo y como testimonio de esperanza en el futuro. Un obispo morirá, pero la Iglesia de Dios, que es el pueblo, no perecerá jamás”.
Hoje faz 27 anos que Monsenhor Óscar Romero foi assassinado por lutar em defesa dos pobres e denunciar as injustiças praticadas em seu país El Salvador. Creio que muitos presentes nunca ouviram falar acerca da sua história de luta por amor ao povo de Deus e ao evangelho do nosso Senhor Jesus Cristo. É exatamente a partir da biografia deste servo do Senhor, latino americano, do final do século 20, que gostaria de trazer alguns desafios para a pastora e o pastor que estão sendo ordenados hoje.

1. Com Monsenhor Romero aprendemos que nossas origens não servem de impedimento para servir a Deus e sim de motivação:

2. Com Monsenhor Romero aprendemos que as certezas são grandes inimigas na vida de um pastor:
2.1 Ele acreditava que era possível acabar com a miséria através da prática da caridade (Os seus biógrafos afirmam que por volta de 1971, ele tinha uma mentalidade conservadora). Era uma caridade sem justiça;
2.2 Ele era aliado da Opus Dei (Chegou a sugerir ao Papa a beatificação de Escrivá de Balaguer, fundador da Opus);
2.3 Ele era consciente das diferenças sociais, porém, acreditava que se devia colaborar com o governo militar para acabar com a mesma;
2.4 Em 1975 acusou muitos sacerdotes de estarem politizados. Neste mesmo documento ele escreveu: “San Salvador possue un gobierno militar y represivo y una cruel diferenca social, en que unos pocos tienen todo y la mayoría vive en la miseria, pero dice que el camino para resolver los problemas es la sana colaboración con el gobierno y que la principal preocupación debe ser la espiritualización del clero”.
2.5 Enquanto Monsenhor Romero pensava assim ele não representava nenhuma ameaça para os grupos políticos e econômicos que mantinham El Salvador debaixo da miséria e da opressão. É importante destacar que em fevereiro de 1977, com o apoio dos setores conservadores da igreja e das famílias ricas, Monsenhor Romero foi eleito Arcebispo da Arquidiocese de El Salvador, que acreditavam que ser ele a melhor alternativa para por freio e encerrar a linha profética e libertadora que havia sido impulsionada em setores da igreja.

3. Com Monsenhor Romero aprendemos que as crises nos levam ao crescimento e ao rompimento:
3.1 Em 12 de março de 1977, um mês depois de Monsenhor Romero tornar-se Arcebispo de El Salvador, o Padre Rutilio Grande foi assassinado com outros dois trabalhadores rurais;
3.2 Na homilia da missa fúnebre do Padre Rutilio Grande, Monsenhor Romero afirmou que Rutilio havia estado em muitos momentos importantes da sua vida e que ele era como um irmão;
3.3 Monsenhor Romero conheceu e se tornou amigo do Padre Rutilio em 1967, quando foi viver no seminário de São José da Montanha que era dirigido por jesuítas. Nesta ocasião ele recebeu o título de monsenhor por ocasião das suas bodas de prata de ministério sacerdotal;
3.4 No ministério pastoral é preciso estar atento a construção de amizades sólidas e verdadeiras;
3.5 O assassinato do Padre Rutilio Grande levou Monsenhor Romero a uma profunda crise que o fez concluir: “Cuando yo lo miré a Rutilio muerto, pensé: si lo mataron por hacer lo que hacía, me toca a mí andar por el mismo camino. Cambié sí, pero también es que volvi de regresso”.

4. Com Monsenhor Romero aprendemos que os estudos, a doutrina, a teologia e a burocracia eclesiástica não devem nos afastar do povo:
4.1 “Es que uno tiene sus raíces. Yo nací en una familia pobre. Yo he aguantado hambre, sé lo que es trabajar de cipote. Cuando me voy al seminario y le entro a mis estudios y me mandan a terminarlos aquí a Roma, paso años y años metido entre libros y me voy olvidando de mis orígenes. Me fui haciendo de otro mundo. Después regreso a El Salvador y me dan responsabilidad de secretario del obispo en San Miguel. Veintitrés años de párroco allá, también muy sumido entre papeles. Y cuando ya me traen a San Salvador de obispo auxiliar, caigo en manos del Opus Dei!”.”

5. Com Monsenhor Romero somos desafiados a sermos profetas e se preciso for, mártires pela causa do evangelho do Senhor Jesus Cristo:
5.1 “Este es el pensamiento fundamental de mi predicación: nada me importa tanto como la vida humana” (16 de março de 1980);
5.2 Monsenhor Romero denunciava os ricos e os chamava de idolatras das riquezas: “Un llamamiento a la oligarquia. Les repito lo que dije la outra vez: no me consideren ni juez ni enemigo. Soy simplesmente el pastor, el hermano, el amigo de este pueblo, que sabe de sus sufrimientos, de sus hambres, de sus angustias; y en nombre de essas voces yo levanto mi voz para decir: no idolatren sus riquezas, no las salven de manera que dejen morir de hambre a los demás. Hay que compartir para ser felices. Y el que no da por amor y por justicia social, se expone a que se lo arrebaten por l violencia” (06 de Janeiro de 1980);.
5.3 Monsenhor Romero denunciava os juizes que se vendiam: “Yo pienso, hermanos, ante esas injusticias que se vem por aqui y por allá, hasta en la Primera Cámera y en muchos juzgados de pueblo ya no digamos, jueces que se vendem. Qué hace la Corte Suprema de Justicia?” (30 de abril de 1978);
5.4 Monsenhor Romero denunciava o imperialismo americano: “estamos hartos de balas”. Pedia que fosse encerrado a intervenção militar dos Estados Unidos (17 de fevereiro de 1980);
5.5 Monsenhor Romero denunciava as organizações guerrilheiras: “Cesen ya esos actos de violência y terrorismo, muchas veces sin sentido, y que son provocadores de otras situaciones m’s violentas” (20 de Janeiro de 1980);
5.6 Monsenhor Romero denunciava o Governo e as Forças Armadas: “La Iglesia, defensora de los derechos de Dios, de la ley de Dios, de la dignidad humana, de la persona, no puede quedarse callada ante tanta abominación. Queremos que el gobierno tome en serio que de nada sirven las reformas si van teñidas con tanta sangre. En nombre de Dios, pues, y en nombre de este sufrido pueblo cuyos lamentos suben hasta el cielo cada día más tumultuosos, les suplico, les ruego, les ordeno, en nombre de Dios: Cese la represión!”(23 de março de 1980)
5.7 Monsenhor Romero viveu 60 anos de sua vida com muita tranquilidade e crescimento pessoal. Foi ordenado em Roma quando tinha 25 anos de idade. Até os 60 anos viveu como um pastor comum que era admirado pela oratória e dedicação aos pobres. Porém, quando converteu o seu coração à luta contra os processos que produziam a miséria e a injustiça em sua terra natal, foi morto em apenas 3 anos de ministério profético.

Concluo a reflexão apelando aos pastores e pastoras presentes que antes mesmo de emitir alguma crítica as idéias aqui apresentadas, parem por um momento para fazer algumas considerações que julgo ser de crucial importância:
1. O que mudou no contexto sócio-econômico da América Latina desde o assassinato do Monsenhor Óscar Romero há 27 anos atrás?
2. Existem grandes diferenças entre o Brasil e El Salvador no quesito justiça social?
3. Existem grandes diferenças entre a maioria dos ministérios católicos e protestantes na América Latina, no quesito da luta pela justiça, libertação e vida digna para o nosso povo?
4. Que Igreja nós queremos deixar de herança para as gerações que estão chegando e que irão nos suceder?
5. Como queremos ser conhecidos e qual legado queremos deixar como pastores e pastoras que obedecem as ordens do Senhor Jesus Cristo?
6. Temos sido bons imitadores do nosso mestre? Se a resposta for afirmativa, porque temos tanto medo da cruz e porque fugimos tanto dela nos dias atuais?
7. Sucesso, fortuna, glória humana, segurança financeira, fama e aplausos de uma sociedade que idolatra os bens materiais e o acumulo devem servir para amaciar nossos egos como ministros do Senhor?
8. O que o Senhor da Igreja pensa dos nossos ministérios pastorais?

Que o Senhor Jesus Cristo, em sua infinita misericórdia possa nos ajudar a revermos nossos caminhos e opções o quanto antes (Mateus 25:31...).

“Una Iglesia que no se une a los pobres no es verdadera Iglesia de Jesucristo” (Óscar Romero)



Só a Deus daí glória!!!


Maceió, 24 de março de 2007


Pr. Wellington Santos